Tirzepatida para tratamento de obesidade nos pacientes com DM2 (SURMOUNT-2)

TRATAMENTO DO DM2TERAPIA FARMACOLÓGICA - OBESIDADE

6/30/20234 min read

Rodolpho Pinto de Mendonça

Existe uma perspectiva preocupante de a obesidade atingir 24% da população mundial em 2035. E sabendo que mais de 2/3 dos pacientes com diabetes apresentam sobrepeso ou obesidade, tornou-se o cerne do tratamento a mudança no estilo de vida com vistas à redução do peso. E diante de várias classes medicamentosas, o uso dos agonistas GIP e GLP-1 tem ganhado cada vez mais notoriedade.

O peptídeo insulinotrópico glicose-dependente (GIP) sozinho não se mostrou eficaz em reduzir o peso. Entretanto, quando associado ao GLP-1 tem se tornado uma ferramenta interessante, principalmente nos pacientes com diabetes tipo 2 (DM2). O estudo SURMOUNT-1 mostrou que a tirzepatida, um agonista duplo dos receptores GIP/GLP-1, foi eficaz na perda de peso dos pacientes com obesidade, sem diabetes. Mas, e nos pacientes com diabetes? Os resultados seriam semelhantes?

Para testar essa hipótese, foi publicado na revista LANCET o estudo SURMOUNT-2 que avaliou se a tirzepatida subcutânea semanal seria eficaz na perda de peso nos pacientes com DM2.

Foi realizado um ensaio clínico randomizado, multicêntrico, placebo-controlado, de 72 semanas de duração, pareado (1:1:1) entre tirzerpatida 10mg x tirzepatida 15mg x placebo. Os critérios de inclusão foram: idade > 18 anos, IMC > 27 kg/m2 e HbA1c entre 7-10%. Os desfechos primários foram: percentual de mudança de peso em relação ao basal e perda de peso > 5%. Os candidatos foram excluídos se apresentassem perda de peso > 5kg nos 3 meses antes do estudo, cirurgia bariátrica prévia (ou em programação), uso prévio de IDDP-4, agonista GLP-1 oral ou qualquer terapia injetável para diabetes.

Quais os resultados?

Entre março de 2021 e abril de 2023, 938 participantes foram selecionados e divididos entre os braços do estudo. A média de idade foi de 54,2 anos, IMC médio inicial foi de 36,1kg/m2, e 51% dos participantes eram do sexo feminino. A HbA1c média inicial foi de 8,02%, e o tempo de duração médio do diabetes foi de 8,5 anos. Houve uma fase inicial de homogeneização dos participantes, através de mudanças no estilo de vida (déficit calórico de 500kcal/dia, atividade física 150min/semana). Ao final de 72 semanas, a perda de peso nos grupos tirzepatida 10mg, 15mg e placebo foi de –12,8% (-12,9kg), -14,7% (-14,8kg) e –3,2% (-3,2kg), respectivamente. Isso resulta numa diferença, em relação ao placebo, de –9,6% com tirzerpatida 10mg e –11,6% com tirzepatida 15mg. A perda de peso superior a 5% foi maior nos grupos tirzerpatida em comparação com placebo (73-89% x 32%).

Em relação aos desfechos secundários, houve redução de HbA1c em –2,1%, tanto no grupo tirzepatida 10mg quanto 15mg, em comparação com –0,5% no grupo placebo. Ao final de 72 semanas, a média final de HbA1c foi de 6,0%, 5,9% e 7,5% nos grupos tirzepatida 10mg, 15mg e placebo, respectivamente.

Também houve redução da pressão arterial sistólica (-6,3mmHg x -1,2mmHg), diastólica (-2,5mmHg x –0,3mmHg) e triglicerídeos (-27,2% x –3,3%) no grupo tirzepatida em relação ao grupo placebo.

E quantos aos efeitos colaterais?

A frequência dos efeitos colaterais foi semelhante entre os grupos. Os mais relevantes foram relacionados ao trato gastrointestinal: nauseas, vômitos e diarreia. Ocorreram principalmente durante a titulação progressiva das doses, sendo na maioria dos casos de intensidade leve a moderada. Menos de 5% dos casos necessitou de descontinuidade do tratamento. Houve 2 casos de pancreatite no grupo tirzepatide e 1 caso no grupo placebo. Não houve casos de câncer medular tireoide ou câncer de pâncreas. A taxa de colelitíase e colecistite aguda foi semelhante entre os grupos.

Cerca de 7% dos participantes nos grupos tirzepatide tiveram eventos adversos graves. Foram relatados 2 óbitos no grupo intervenção, contudo não relacionados com o tratamento em si.

Conclusões

A tirzepatida nas doses semanais de 10mg e 15mg foi eficaz em reduzir perda de peso de forma expressiva nos pacientes com diabetes e sobrepeso ou obesidade. Apesar de não existir (ainda) estudos head-to-head entre tirzepatida x semaglutida neste cenário, o primeiro parece levar vantagem no quesito perda de peso a longo prazo (15% x 10%). Isso pode ser possível fruto do efeito sinérgico GIP/GLP-1 na molécula do tirzepatida. Outra vantagem do presente estudo foi a redução importante da HbA1c (-2%) em ambas as dosagens utilizadas, com valor final de 5,9%. Além disso, quase metade dos participantes nos grupos de intervenção teve normoglicemia.

É importante pontuar que o estudo foi patrocinado pela empresa responsável pela fabricação da medicação. Vamos aguardar a validação externa na população e avaliar novos dados.

Lembrando que a tirzepatida (Mounjaro®) foi aprovada em 2022 pelo FDA para tratamento dos pacientes com diabetes tipo 2. Apesar de metanálise prévia já mostrar segurança cardiovascular da medicação, está em andamento um estudo específico a fim de avaliar MACE nos pacientes com diabetes usando a medicação (SURMOUNT-CVOT).

Bibliografia:

  • Garvey WT, Frias JP, Jastreboff AM, le Roux CW, Sattar N, Aizenberg D, et al. Tirzepatide once weekly for the treatment of obesity in people with type 2 diabetes (SURMOUNT-2): a double-blind, randomised, multicentre, placebo-controlled, phase 3 trial. The Lancet.